Os fundos de pensão brasileiros passaram bem pela crise global. Mesmo assim, a regra que disciplina como podem ser aplicados os recursos, a resolução 3456, aprovada pelo Conselho Monetário Nacional (CMN) em 2007, deve mudar até o final do ano.
No exterior, as perdas provocadas pela crise chegaram a 30% do patrimônio de fundos de pensão em alguns países da Europa; no Brasil, elas foram marginais, da ordem de 1,5% a 2,5%, segundo o diretor de monitoramento e controle da Secretaria de Previdência Complementar (SPC) do Ministério da Previdência, Carlos Eduardo Rodrigues da Cunha Gomes.
Hoje, o patrimônio do setor é de R$ 412 bilhões, dos quais R$ 196,5 bilhões estão investidos em títulos públicos federais, seguidos de ações (R$ 110 bilhões) e papéis de crédito privado (R$ 43,6 bilhões).
Embora a passagem sem maiores cicatrizes pelo que parece ter sido o pior momento da crise global possa ser explicada pelas taxas de juros ainda elevadas no país, como acredita Everaldo Guedes de Azevedo França, sócio da PPS Consultoria, Gomes prefere dizer que o feito é um sintoma de que a “regra (brasileira) é boa, embora complexa e difícil”. A ideia, agora, é simplificá-la, como disse o diretor da SPC durante o 5º Congresso Anbid de Fundos de Investimento.
Gomes contou que a SPC consultou as várias entidades do mercado, inclusive Anbid, Secovi e Abrapp, para colher subsídios e sugestões desde setembro do ano passado. Nos últimos meses, a secretaria fechou seu texto de proposta que, agora, será encaminhado para discussão no Ministério da Fazenda, no Planejamento e Banco Central.
“A regra sempre vai procurar tutelar o risco. O que nós pretendemos é torná-la mais simples, com maior clareza, para o nosso entendimento, do dirigente (do fundo de pensão) e do gestor (terceirizado)”, afirmou, para depois acrescentar que uma outra preocupação é com a redução de custos.
Falando ao plenário, Gomes disse concordar com uma das principais sugestões de alteração feitas pela Anbid: a de permitir que as entidades passem a contabilizar como ativo a cota de um fundo de investimento.
A SPC gostaria, na medida possível, de tornar indiferente o veículo do investimento, ou seja, se é um CDB ou uma debênture que, por hipótese, paguem a mesma rentabilidade. E concentrar sua preocupação na apuração do risco envolvido em cada alternativa. No caso, o risco de crédito de um banco ou de uma empresa. Hoje a regra fixa limite para veículos e, portanto, permite que o gestor arbitre entre veículos em que fiquem claros os riscos distintos, para uma mesma rentabilidade, que ele passa a correr.
Assim, deve ser feita uma limpeza dos vários limites, além de reagrupadas algumas alternativas de investimento. O objetivo da regra, afinal, é estabelecer limites para que se possa controlar riscos e garantir pagamento dos benefícios.
Indagado sobre a possibilidade de se utilizar a chamada de margem como instrumento de controle de risco como propõe a Anbid, o diretor da SPC disse que estuda a proposta “com muito carinho, mas apenas para operações com derivativos”.
Segundo ele, existe a necessidade de se ter outros modelos de controle de risco, que devem ficar mais claros e coerentes com os objetivos do sistema.
De fato, segundo aponta França, da PPS consultoria, e que, durante o Congresso, pediu mais isenção e menos conflito de interesses para os gestores, uma das grandes falhas da 3456 é justamente a de não tornar explicito qual é o entendimento do legislador sobre o que é hedge e sobre o que é alavancagem.
França lembra que, por exemplo, como o passivo de um fundo de pensão são os benefícios, e eles são corrigidos pela inflação (normalmente INPC ou IPCA) mais uma taxa de juros, não é possível considerar que se está sendo conservador na gestão quando os recursos estão aplicados no CDI. Afinal, se isso acontecer, o fundo estaria “descasado”.
Essa aplicação é, sim, permitida pela regra atual. Tanto que, lembrou em sua exposição Cunha Gomes, os fundos têm cerca de 14% de sua carteira de títulos públicos em LFTs e outros 7,4% em LTNs. Na nova regra, essa relação entre ativos e passivos deve ficar mais clara e as regras de “casamento” mais explícitas. Ou seja, estar “descasado” poderá ser interpretado como uma forma de alavancagem.
Outro motor das mudanças será a necessidade de diversificação, que vai se acentuar graças ao cenário de juros civilizados de forma estrutural. Maurício da Rocha Wanderley, diretor de investimentos da Valia, que é o 5º maior fundo de pensão do país, estima que as taxas fiquem ao redor de 4,9% até 2018.
Ele defendeu a necessidade de serem incorporados investimentos alternativos, como papéis emitidos pelo setor privado, e no exterior, para depois lembrar que a regra atual, que limita a possibilidade de investir no exterior a 3% da carteira e em um fundo composto com outras fundações, exige um esforço adicional de articulação, nem sempre recomendável ou possível.
“Por que você quer investir no exterior se todo mundo quer investir no Brasil?”, foi a indagação que França diz ter ouvido nos Estados Unidos recentemente. E a resposta foi a mais óbvia, que consta dos manuais, a necessidade de diversificação de riscos.
Ele lembra que, embora a Bolsa brasileira tenha uma excelente perspectiva, ela é uma Bolsa de commodities, muito concentrada em determinados papéis, por exemplo.
Indagado sobre o assunto, Gomes admitiu a possibilidade de serem criados novos limites, maiores, para essas alternativas de investimento, bem como a criação, como propõe a Anbid, de uma nova caixa para estas alternativas. Cabe lembrar, porém, que, atualmente, os tetos existentes não foram atingidos: ele é de 50% para ações, por exemplo, e os fundos se contentam com 26%.
Publicada em 29/05/2009 13:33:31