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Longevidade leva a novos desafios

Mais idosos vivendo por mais tempo. A longevidade do brasileiro exige políticas públicas específicas de atendimento – na saúde, na previdência, na assistência social – e também direcionadas ao avanço científico. No passado, o cidadão morria de pneumonia ou tuberculose antes dos 50 anos. Agora, sofre de demências provocadas pelo Alzheimer ou o mal de Parkinson.

“O organismo não tinha tempo para desenvolver as doenças degenerativas que estamos conhecendo nos últimos anos. Por isso os diagnósticos devem ser mais precisos, contemplando possibilidades que antes não eram cogitadas”, observa o neurogeriatra Luiz Carlos Benthien. Soma-se a isso a falta de recursos técnicos e o despreparo de profissionais em um país de dimensões continentais e o resultado é um batalhão de pacientes negligenciados, vítimas de subtratamentos.

Morador da cidade de Paulo Frontin, no Sul do estado, o aposentado Pedro Travinski, de 73 anos, está prestes a encerrar a peregrinação de uma vida inteira em consultórios médicos. Não bastasse a infinidade de diagnósticos imprecisos, Travinski consumiu medicamentos arriscados para a sua condição de saúde por mais de dez anos, para tentar curar as fortes dores de cabeça, tonturas e zumbidos no ouvido que sentia. “Passei por médicos de toda região. Fiz dezenas de tratamentos. Muitos me diziam que era do sistema nervoso. Mas ouvi coisas do tipo ‘esse é velho mesmo, não tem mais o que fazer’”, conta.

Esgotado pela doença e os efeitos colaterais dos medicamentos que tomou – de vitaminas a anticonvulcionantes e sedativos –, Travinski pediu à filha, que mora na capital, para ir a um médico especialista. Há dez dias uma ressonância magnética identificou as causas dos sintomas relatados pelo paciente: um tumor benigno localizado no cerebelo, parte posterior do cérebro, que já afeta sua audição. Uma microcirurgia de meia hora vai livrá-lo do problema ainda neste mês. “O desgaste na saúde e o dinheiro que ele gastou ao longo desses anos não serão recuperados”, observa Benthien.

O risco da dúvida

O paciente da terceira idade é queixoso. Ele entra no consultório e reclama um pouco de tudo: doem as costas, a cabeça, as articulações, o peito. E o perigo está na atenção que o médico dá a essas reclamações. “Sente mais dor quem tem mais patologias. E o idoso sofre mais com doenças degenerativas. O problema é achar que ele deve sentir dor porque é velho. O sintoma precisa ser minuciosamente investigado”, explica o neurogeriatra Luiz Carlos Benthien, do Hospital Pilar, de Curitiba.

A interpretação errada dos sintomas em pacientes idosos é mais arriscada do que em outras faixas etárias. O organismo debilitado pelo envelhecimento tem mais dificuldades para metabolizar os medicamentos. Os rins, por exemplo, funcionam com 40% da capacidade de um adulto jovem, mesmo em pessoas sem problemas renais crônicos. O mesmo ocorre com o fígado. A retenção de gordura e água no organismo do idoso é outro fator que altera a absorção dos componentes químicos. Por isso a indicação dos medicamentos deve ser criteriosa.

Demências

O abuso de medicamentos pode levar a demências por intoxicação. Elas regridem assim que o paciente é submetido ao tratamento correto.

Tipos

As demências podem ser degenerativas, como a provocada pelo Alzheimer; vasculares, resultado da má circulação sanguínea no cérebro; priônicas, causadas por mutação genética e por agentes externos; e reversíveis, produzidas pela intoxicação de medicamentos ou tumores e hematomas.

Tratamentos

Além do medicamento adequado, no caso das reversíveis, a eliminação do agente causador já leva à melhora necessária para o bem-estar do paciente. Em casos mais severos, há o monitoramento e a redução dos danos.

Prevenção

Estímulo neurológico e de interação social são fundamentais para manter a saúde mental. A neuropsicóloga Ticyana Moralez da Silva ensina exercícios simples, como fazer a lista do supermercado mentalmente para depois conferir o que falta na dispensa ou brincar de Stop com os netos: alguém recita o alfabeto e ao gritar “stop”, o parceiro precisa dizer as palavras que começam com a letra em que o adversário foi interrompido.

“Além da combinação perigosa entre medicamentos, há os efeitos colaterais potencialmente arriscados em organismos idosos. Antes de receitar, o profissional precisa avaliar o nível do benefício que o medicamento, associado ou não, vai trazer ao paciente”, explica a neurologista Cláudia Baeta Panfílio, uma das coordenadoras do Simpósio Anual de Neurologia do Hospital Pilar, que ocorre no próximo sábado, em Curitiba. O evento vai reunir especialistas para discutir a abordagem do tratamento do paciente de terceira idade, a importância dos diagnósticos precisos, acompanhamento de demências e o alto uso de medicamentos pelos maiores de 60 anos.

A administração correta dos medicamentos para idosos tem o objetivo de evitar perdas de qualidade de vida e até prejuízos à sua saúde. Além de sobrecarregar o organismo, medicamentos mal administrados – ou em doses erradas ou para curar problemas mal diagnosticados – podem provocar efeitos colaterais graves, intoxicação, ou mascarar outras doenças. É o que os médicos chamam de iatrogenese, quando um medicamento provoca outras doenças, ao invés de promover a cura do mal para o qual foi originalmente indicado. Remédios para labirintite, por exemplo, podem provocar sintomas de parksionismo, como tremores involuntários. O controle da hipertensão precisa cuidar para não provocar tonturas, que podem levar a desmaios e quedas, e por consequência, fraturas. Simples analgésicos são perigosos, se o paciente tiver outro problema de saúde. “Uma aspirina, para combater a dor, pode provocar sangramento gástrico, se o paciente tiver uma úlcera”, exemplifica Benthien.

Por isso, além do acompanhamento médico rigoroso, é fundamental fugir da automedicação e da “empurroterapia”, praticada nos balcões de farmácia. “Sem saber, o paciente ou sua família estão ampliando o risco de complicações ao optar por um remédio sem a prescrição adequada”, diz o médico. Outro comportamento comum e extremamente perigoso é a caixinha de remédios guardada em casa. As sobras de medicamento, em geral, são reaproveitadas quando os sintomas reaparecem, adiando ainda mais uma solução definitiva para o problema. “Ou então o sujeito pega o comprimido que sobrou e repassa para a vizinha, na tentativa de ajudar em um problema de saúde semelhante ao dele. Dependendo do histórico da vizinha, pode haver mais complicações do que benefícios”, explica.

Mas não basta ter a receita médica correta. É preciso seguir o tratamento. Deixar de tomar uma dose ou compensar na próxima administração também colocam a saúde em risco. Em asilos ou casas de repouso, as trocas de medicamento são comuns e arriscadas. Em casa, os cuidadores devem estar atentos às rotinas de administração de medicamentos. “O ideal é manter uma planilha com o horário, a dose e quem deu o remédio. Isso evita a falha ou intoxicações por doses duplicadas”, ensina Cláudia.

Publicada em 16/04/2009 07:50:04

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