O presidente da Alstom Transport, Philippe Mellier, disse que, apesar da crise, os pedidos da companhia cresceram |
O transporte ferroviário está na ponta de uma década turbulenta, com fusões, aquisições e novos investidores da indústria aérea e de outras áreas, de acordo com o presidente executivo de uma das maiores fabricantes mundiais de trens. Companhias ferroviárias nacionais absorverão seus vizinhos mais fracos e uma geração nova de operadores privados investirá em trens de alta velocidade para explorar infraestrutura nova construída com centenas de bilhões de dólares investidos pelos governos, disse Philippe Mellier, presidente da Alstom Transport.
“Se você quiser ver o futuro de nossa indústria em 30 anos, olhe para o que aconteceu na indústria de aérea durante os últimos 15 anos”, disse Mellier. “Quinze anos atrás todo país tinha sua própria linha aérea. Elas ainda mantêm seus nomes. A Swiss é alemã, a Austrian Airlines é alemã, a Alitalia é francesa. Nós veremos consolidação.”
A indústria de infraestrutura ferroviária está subindo na crista de uma onda poderosa de dinheiro público – pacotes de empréstimos no valor de incontáveis bilhões destinados a gerar empregos e retirar regiões remotas da lama financeira com transporte de carbono neutro. De Buenos Aires a Beijing, governos estão submetendo os contribuintes a um renascimento ferroviário. Até mesmo nos Estados Unidos, US$ 13 bilhões do dinheiro público viabilizarão capital para dez corredores de trem de alta velocidade enquanto o Presidente Obama oculta seu estímulo Keynesiano em uma capa ecológica. E os planos de gastos públicos estão criando uma carteira grande de pedidos para a Alstom e suas concorrentes – a Siemens, da Alemanha, e a Bombardier, do Canadá.
A companhia francesa registrou 7,4 bilhões de euros em pedidos de trens nos nove meses até o fim de dezembro, um quinto a mais do que no mesmo período de 2007. Apesar da crise econômica no final do ano passado, os pedidos ferroviários cresceram 61%. “Nosso mercado vai ser mais elástico que outros mercados, até mesmo se a crise econômica for muito longa”, disse Mellier. “O básico vai ficar para o longo prazo – segurança energética, o meio ambiente e a necessidade de conter a crise.”
É dinheiro alto – bilhões e para períodos longos – e é altamente político, reconhece Mellier. A pessoa que toma a decisão de comprar é frequentemente um político com um mandato eleitoral com duração de, no máximo, cinco anos, e que nunca irá inaugurar o novo trem. “Você precisa de coragem política para dizer: eu vou investir bilhões e não vou me beneficiar politicamente do resultado”, ele afirma.
Porém, fundos de âncora do governo vêm provocando interesse enorme de empresários e instituições financeiras ávidos a explorar a infraestrutura ferroviária de alta velocidade em expansão. Embora a Inglaterra tenha parcialmente escapado de sua experiência desastrosa no setor ferroviário privado, outros países vêm se aventurando. “Investidores que miram este modelo [alta velocidade] têm se aproximado”, disse Mellier. “Este é um setor que está chamando a atenção. Dá para vislumbrar o futuro.”
A previsão dele será repetida por Sir Richard Branson, que incitará o governo a permitir que empresas do setor privado, como a Virgin Rail, instalem novos trilhos e construam novas estações para competirem com a Network Rail, a estatal proprietária da infraestrutura ferroviária britânica. Além disso, o presidente da Virgin está dando seu lance para obter um pedaço maior do trem do Reino Unido em um momento politicamente delicado. Lord Adonis, o ministro do Transporte, está defendendo a expansão ferroviária, incluindo a High Speed 2, que uniria Birmingham e Manchester a Londres, e a High Speed 1, a ligação ferroviária do Eurotúnel e seu término na estação St Pancras.
Porém, no momento, não há dinheiro público disponível para projetos como esses, e Sir Richard está esperando obter da Network Rail esquemas de infraestrutura ferroviária menores e lucrativos, tais como a nova linha que permitiria que os trens, na linha principal da Virgin na Costa Oeste, acessassem St Pancras e se conectassem com trens da Eurostar.
O entusiasmo do setor privado em relação à ferrovia já ecoou na carteira de encomendas da Alstom. O primeiro cliente da quarta geração do trem de alta velocidade, o AGV (Automotrice à Grande Vitesse), não é a SNCF, a ferrovia estatal francesa, mas um consórcio de ricos investidores italianos, liderados pelo presidente da Fiat. Dentro de dois anos, uma frota de AGVs, adquiridos com 1 bilhão de euros de capital privado, estará se acotovelando com locomotivas de estatais italianas enquanto trafegam entre Turin e Nápoles.
Mellier vê lógica em lugar de ironia nos investimentos da Virgin e NTV no transporte ferroviário de alta velocidade. Ele disse: “Há empresários talentosos e astutos ingressando no mercado ferroviário, de um lado vindos indústria aérea e, de outro lado, da indústria automobilística. Este é um sinal forte.” Ele notou a ambição da Air France de construir sua própria rede ferroviária de alta velocidade, enquanto a empresa abandona os esforços para competir nos voos regionais .
A linha aérea francesa já não oferece voos para Lyon e reduziu drasticamente a programação entre Paris e outras cidades domésticas. “Com a Air France, a Virgin e recém-chegados do mercado aéreo, eles estarão muito ansiosos para ter o tipo de negócio ao qual estão acostumados na indústria aérea – “administração de rendimento”, ele disse. Isso significa focar em posicionamento de marketing e maximizar rendimentos do serviço, deixando a manutenção dos trens para outros fazerem. “Tudo é terceirizado. Será cada vez mais o modelo da indústria aérea. Eu quero estar lá para agarrar essas oportunidades.”
Para a Alstom, significa dar conta das demandas de clientes fora das estatais ferroviárias, com sua infraestrutura herdada e departamentos de material rodante. Também significa maior eficiência industrial interna. Mellier quer poder entregar peças de reposição a prazos curtos ao redor do mundo, à maneira dos fabricantes de aeronaves e motores a jato.
A Alstom pactuou recentemente um investimento conjunto na Transmash-holding, uma especialista russa de material rodante. Nas próximas duas décadas a Rússia gastará 200 bilhões de euros consertando e aprimorando uma malha que foi abandonada até apodrecer, quando o estado comunista se desmoronou. Isto significa construir 1.000 locomotivas por ano durante 20 anos. O presidente da Alstom disse: “É um país atravessando 12 fusos horários e os russos amam viajar de trem. Se houver crescimento em qualquer lugar no mundo para a indústria ferroviária, será na Rússia.”
Publicada em 18/05/2009 13:17:31