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A reforma de Dilma

Governo já prepara plano de mudança da Previdência que petista apresentará se for eleita

De forma reservada, a Secretaria de Política Econômica do Ministério da Fazenda, comandada por Nelson Barbosa, trabalha em uma nova proposta de reforma da Previdência, a ser apresentada ao Congresso pela candidata do PT à Presidência, Dilma Rousseff, caso ela seja eleita. Barbosa é o principal interlocutor de Dilma na área econômica, e cotado para assumir o Ministério da Fazenda em caso de vitória petista. Para apressar o processo de aprovação e reduzir o custo político, as mudanças na Previdência só valeriam para os novos trabalhadores, tanto os da iniciativa privada (INSS) como os do setor público.

Pelos estudos em curso, não haveria regras de transição para quem já está no mercado, porque elas tornariam o novo modelo mais complicado — e ele enfrentaria forte resistência no Congresso e entre os sindicatos, como já ocorreu em outras tentativas. Ou seja, não se pretenderia mais o grande desgaste de tentar mexer nos direitos adquiridos dos trabalhadores. Em mais de uma oportunidade, Dilma negou a intenção de reformar a Previdência, justamente pelo receio desse desgaste.

Por isso, uma das hipóteses é fazer um corte no tempo, de forma a incluir no novo regime de aposentadoria quem nasceu a partir de 1990 (hoje, com 20 anos, a pessoa está, em tese, entrando no mercado de trabalho), tanto no setor privado quanto no funcionalismo. Segundo fontes, os pontos que estão sendo alinhavados devem se transformar numa proposta em dezembro, se Dilma for eleita, e enviada ao Congresso nos primeiros meses do novo governo.

Benefício de 3 anos para viúvas jovens

Para requerer o benefício, segundo fontes envolvidas na discussão, uma das propostas é que os futuros trabalhadores tenham que cumprir um requisito principal: que a soma da idade e do tempo de contribuição alcance 105 anos, no caso do homem, e 95 no caso da mulher. Isso, na prática, resultaria em nova idade mínima de aposentadoria, mas a proposta teria a preocupação de não prejudicar quem entrou no mercado mais cedo (com menos de 18 anos, por exemplo), como sempre defendeu o presidente Lula.

Por essa regra em estudo, uma pessoa que comece a trabalhar aos 18 anos poderá se aposentar aos 62,5 anos de idade, depois de 42,5 anos de recolhimento da contribuição previdenciária.

Outro conceito sempre defendido pelo presidente Lula também deve ser mantida na proposta de reforma de um eventual governo Dilma: as regras diferentes, e favoráveis, para as mulheres trabalhadoras, por causa da chamada “dupla jornada de trabalho” (em casa e no emprego).

A convergência entre os regimes de aposentadoria público e privado seria um dos pilares da proposta de reforma da Previdência, a fim de evitar as enormes disparidades entre os dois sistemas, ambos deficitários e com custos semelhantes — sendo que o público tem cerca de 1 milhão de beneficiários, e o privado, 24 milhões.

Para isso, os estudos que estão sendo feitos insistem na criação de um fundo de aposentadoria complementar para os servidores público, de modo que eles recebam do Tesouro apenas o teto do INSS (hoje em R$ 3.467,40), com complementação do fundo de pensão.

Essa regra valeria também apenas para os novos funcionários — ou seja, aqueles que ingressarem no serviço público após a aprovação dessa eventual reforma.

Há consenso que a proposta que já tramita no Congresso com essa finalidade é inviável, porque permite que os atuais funcionários migrem para o novo fundo, deixando de ajudar a bancar, junto com o Tesouro, as aposentadorias atuais. Uma migração em massa poderia gerar um rombo de até 6% do Produto Interno Bruto (PIB) no sistema previdenciário, segundo interlocutores. O déficit nos dois sistemas está em pouco mais de 1% do PIB em 2010.

Já as futuras pensões, que hoje são integrais e pagas pelo resto da vida, tanto pelo INSS como pelo regime próprio do serviço público — independentemente da idade da viúva e se ela tem filhos ou não —, teriam mudanças profundas na proposta em estudo. Por exemplo, se a viúva do segurado for jovem e sem filhos, seria concedido um benefício temporário de três anos, por conta do trauma. O prazo da concessão do benefício pode levar em conta o número de filhos menores.

Segundo interlocutores da presidenciável petista, o objetivo da reforma é preparar o sistema previdenciário brasileiro para as próximas três décadas, além de sinalizar uma preocupação de um eventual novo governo do PT com as contas públicas. O aumento da expectativa de vida e o rápido envelhecimento da população, com cada vez menos trabalhadores jovens para ajudar a dividir a conta, dão o alerta de que o modelo atual não é sustentável a longo prazo.

Campanha não admite a discussão

O crescimento da economia acima de 5%, com impacto positivo na geração de emprego e melhoria na arrecadação, explicou uma fonte, ajudarão a equilibrar o sistema atual, se for aprovada uma nova reforma.

Também é consenso que as mudanças precisam partir da Fazenda (que administra a arrecadação e cobre o rombo) e não da Previdência, cuja tarefa é cuidar do pagamento dos benefícios, além de ser foco de maior pressão dos aposentados.

Oficialmente, nenhum integrante da campanha de Dilma ou da área econômica do governo admite a discussão em curso — até mesmo para não interferir nas eleições.

E também porque não faz parte do programa de governo do PT, e nem das declarações públicas de Dilma, qualquer proposta de mudança na Previdência.

Mas é certo entre esses economistas que uma reforma na Previdência é o primeiro, e principal, passo de um ajuste fiscal nas contas públicas. Especialistas no assunto estão sendo convidados a dar contribuições.

Especialistas: Reforma é inevitável

A sinalização de um novo regime de aposentadoria, ainda que seja só para os novos trabalhadores, caso o PT conquiste um novo mandato no Planalto nas eleições de outubro, é um passo importante para aumentar a confiança dos investidores na economia brasileira. Para especialistas em questões previdenciárias, seria uma demonstração de que o problema fiscal, o elevado gasto com benefícios no Brasil — um país ainda jovem — tem data para acabar.

Do ponto de vista político, defendem ainda, é mais viável não misturar situações distintas numa mesma proposta: criar regras de transição para os atuais trabalhadores; e regras permanentes que vão entrar em vigor em quarenta anos para os novos.

— Um modelo só para os novos melhora muito. Acho que é o mínimo e já tinham que ter feito — afirmou José Cechin, ex-ministro da Previdência.

Ele considera factível a fórmula do somatório de 105 anos (65 anos de idade e mais 40 de contribuição), pois só entraria em vigor 40 anos depois de aprovada, quando a expectativa de vida do brasileiro será maior.

— É melhor do que não fazer nada. Uma reforma só para os novos reduz o custo político de se aprovar uma mudança mais ampla, e passa um sinal de que o governo está preocupado com as contas públicas ao longo prazo — emendou Marcelo Caetano, pesquisador do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea).

Caetano, que participou das duas últimas reformas previdenciárias (do ex-presidente Fernando Henrique Cardoso, em 1999, e do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, em 2003), como técnico na Ministério da Previdência, chama a atenção para a despesa do governo com os dois regimes (INSS e setor público).

Um terço de toda arrecadação tributária brasileira, frisou, é usada só para pagar aposentadorias e pensões.

— Caso essa situação persista, só há um jeito, que é aumentar a carga tributária e mesmo assim, isso tem limite — destacou Caetano.

Segundo ele, a situação tende a se agravar diante das mudanças no perfil demográfico e dos reajustes do salário mínimo e benefícios acima da inflação.

Publicada em 30/08/2010 15:42:47

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